Saturday, January 19, 2008

A Felicidade hoje é fechar os olhos






Que felicidade é essa que buscamos se considerarmos as
impiedades cometidas por tantos?


Antigamente, a felicidade era um espécie de missão a ser
cumprida, a conquista de algo maior, que nos coroasse de
ouros, a felicidade demandava o sacrifício, a renúncia, a luta
contra os obstáculos. A idéia de que a felicidade se constrói,
ficou pra trás. Hoje felicidade é ser desejado!
A idéia de felicidade não é mais interna, como os monges,
ou a calma vivência do instante, ou a visão de beleza.
Felicidade é entrar comercial de sorrisos, festas e virar
alguém a ser consumido.Felicidade é ter um bom funcionamento....
Hoje, sós somos extensões das coisas...a extensão de um
banco, de um celular,...
Assim como a mulher deseja ser um eletro-doméstico, um
avião, uma peituda, bunduda, o homem quer sr uma ‘ferrari’
um torpedo inteligente, e mais que tudo, um grande pênis
voador sem flacidez e angústias.
Confundimos nosso destino com o destino das coisas..felicidade
não é mais lenta ou contemplativa – é velocidade.
O mundo veloz da internet, do celular. do mercado financeiro
nos imprimiu um ritmo incessante,uma gingana contra a morte
ou velhice, melhor dizendo, contra a obsolescência dos produtos
ou a corrosão dos materiais.
Somos ‘’felizes’’ dentro de um chiqueirinho de irrelevâncias,
bagatelas, micharias...não precisamos saber nada, o sujeito só
existe se aparecer.
Há alguns anos, a infelicidade, a tragédia ainda provocavam
escândalos. O holocausto, Hiroshima, jogaram o mundo em cava
depressão, mudou a visão da vida. E hoje?
O crime hediondo está mais aceito , o Iraque é apenas um
assalto corriqueiro à razão, acostumado ao horror como um
cotidiano inevitável. O horror deixou se der um susto, faz parte
da vida. A incessante pantomina da alegria movida pelas novidades
eletrônicas, pelo marketing inovador da tecno-ciência serve para
camuflar a melancolia que nos atinge.
O pensamento humanista está lamentoso de tanto absurdo.De
que adianta falar em compaixão ou afeto a propósito de um
menino de 13 anos que decepa a cabeça de um colega com um
machado, com as mães atirando filhos nas lixeiras e brejos?
Como falar em democracia com muçulmanos analfabetos que
desde o século 7 se massacram por um ser inexistente, educando
crianças-bombas nas ‘’madrassas’’ para extirpar qualquer
resquício de razão no Ocidente, enquanto do outro lado os monstros-
caretas do Bush repetem mantras da Bíblia fundamentalista?

Para a felicidade, só nos basta ‘’não ver’’. Fechar os olhos.
É uma lista de negativas: não tem câncer, não ler jornal,
não ligar para as tragédias, não olhar os meninos malabaristas
no sinal, não ver os cadáveres explodidos na televisão, não ter
coração, se transformar num clone de si mesmo, num andróide
programado para ter esperança, vivendo um presente infinito e longo.

Há um grande livro de ‘science fiction’, talvez o maior, ‘’Tiger Tiger’’,
de Alfred Bester, onde há um grande spa em Marte, para super
milionários onde eles teriam a suprema felicidade de viver extirpados
todos os sentidos, apenas os cérebros funcionando em ’alfa’, livres
de qualquer angústia. Um dia, chegaremos lá.
Oscilamos entre o desejo de ser especiais, únicos, brilhantes indivíduos,
celebridades que fujam do escuro anonimato e o desejo de virar pó.
Em tudo sempre em nome da palavra-chave da época: a liberdade,
que todos fingem querer, a a liberdade respirando como um bicho
sem dono entre o indivíduo e a massa, a liberdade- essa coisa que
provoca tanta angústia...
A liberdade/felicidade virou mais uma camuflagem do capitalismo,
no fundo temos uma secreta nostalgia da submissão.
Dostoievsk acerta na mosca, prevendo o tempo de hoje, quando no
espantoso e profético capítulo dos ‘’Irmão Karamazov’’, intitulado
‘’O grande inquisidor’’, nos escreve do passado, na grande diatribe
do Inquisidor a Cristo:

‘’Você esqueceu que o homem prefere a paz e mesmo a morte ao
invés da liberdade de ter de escolher entre o bem e o mal?
Pode ser muito sedutora a idéia para os homens de ‘livre arbítrio’,
mas nada lhes é mais doloroso.Em vez de princípios sólidos que
pudessem tranqüilizar a consciência humana, você escolheu noções
vagas, enigmáticas, tudo que vai além da possibilidade humana e
assim, você agiu sem amor por eles, você, que diz ter vindo salvá-los.
Você aumentou a liberdade humana, em vez de confiscá-la (..)
depois de 15 séculos o que restou?
Você não conseguiu elevar ninguém até a sua altura divina!’’

É isso aí o chamado indivíduo livre está cada vez mais ridículo.
O ‘eu’ virou um privílégio para meia dúzia de loucos.. Entramos
no século 21, regidos por deuses malucos, do oriente ao ocidente.
Na realidade, estamos no século 7, apenas com
tecnologia avançada...

Texto de Arnaldo Jabor – Reflexões Políticas

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